sexta-feira, 27 de abril de 2012

Patrimônio público de quem?

por João Victor Acioly


Do alto, a estátua em bronze de João Lins Vieira Cansanção de Sinimbu, o Visconde de Sinimbu, observa envergonhado o descaso daquela que leva seu nome. Refém de mendigos, assaltantes e feiras ilegais, a Praça Sinimbu se tornou local de presença desconfortante para visitantes e turistas, e principalmente para moradores e equipamentos culturais em seu entorno. Mas nem sempre foi assim.

Com mais de 100 anos de história, a praça foi símbolo de modernidade e ícone da arquitetura, onde famílias passavam os domingos a apreciar as sessões musicais do coreto e a sinuosidade de esculturas de figuras mitológicas. Em outros tempos, após redesenho na administração do prefeito Sandoval Cajú, a fonte do Menino Mijão, bancos e brinquedos em marmorite e painéis com mosaicos em forma de coqueiro, jangada, pescador, entre outras amostras da identidade alagoana, ainda tornavam convidativo o ambiente.

Fora da rota da administração pública desde 1992 – datada a última restruturação, durante a gestão Pedro Vieira –, o local sofre há alguns anos com um problema de maior abrangência: o acampamento de trabalhadores rurais. Sem o mínimo de saneamento, limpeza urbana e segurança, famílias passam semanas locadas na praça para cobrar ações e pressionar a superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a tomar uma atitude. Desta vez a situação é realmente preocupante. Parte das famílias despejadas do Acampamento Cavaleiro, em Murici, estão acampadas na praça desde janeiro de 2011 e contribuem para a sujeira e depredação de território público.

O que se vê, no entanto, não é culpa exclusiva do Movimento Sem Terra (MST). Aimê Merine, coordenadora do acampamento, afirma que a limpeza urbana deixou de ser feita logo após a ocupação dos trabalhadores rurais na praça e só voltou a ser realizada no fim de fevereiro. A manutenção até então era feita pelos “moradores”, a fim de preservar a própria higiene e adquirir produtos recicláveis para venda. “Aqui tem muito rato. Não podemos deixar uma vasilha aberta que corre o risco de aparecer ratos lá”, conta a líder do MST.

O espaço físico é dividido também com a Feira de Artesanato Guerreiros de Maceió, relocada para a Praça Sinimbu pela prefeitura, no fim de 2010. Sem visibilidade, a queda nas vendas é de 95% em comparação ao último ponto, no Jaraguá, e parte dessa baixa, acreditam os artesãos, deve-se à imagem negativa da ocupação. “O problema é o cartão de visita. É uma imagem ruim que já perdura por um ano e dois meses”, pontua a artesã Hélia Miranda.

Diretora da Pinacoteca Universitária, Geisa Brayner lamenta a ocupação do MST ainda não ter sido remediada e critica a falta de atividade dos órgãos competentes para solução do problema. “Pessoas moram aí, então eles sujam com comidas, com dejetos e a praça fica feia, depredada. Praça não é lugar para isso. É lugar para encontro, para embelezamento da cidade, e não para moradia, e isso afasta as pessoas desavisadas”, pontua. No entanto, ela garante que eles são pacíficos. “Honestamente, eles nunca incomodaram”, conclui Márcia.

Madalena de Oliveira, Coordenadora do Núcleo de Ação Educativa do Museu Théo Brandão, conta que o que incomoda é o trânsito e o mau-cheiro causado pelo lixo produzido pelas famílias. Mesmo com péssima imagem causada pelos Sem Terra, a situação parece não ter prazo para ser solucionada. Em novembro foi anunciada uma proposta de compra de quatro imóveis na zona rural para abrigar um total de 100 famílias, que deveria durar no máximo seis meses para ser concretizada. Os recursos destinados a esta aquisição somam R$13 milhões, nos quais 20% seriam dados pelo Governo do Estado e os outros 80% retirados do orçamento do Incra.

De um lado, o Governo já alertou que sua parte é muito maior do que pode ofertar; do outro, o plano orçamentário do Incra foi reduzido em 70% pelo Ministério do Planejamento. Os trabalhadores se recusam a desocupar a praça enquanto não forem relocados para uma terra na qual possam chamar de sua, enquanto a sociedade, já habituada, assiste a todo esse desrespeito e luta de bandeiras como boa refém que é.

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